Viseu livre do cerco das portagens, finalmente!

RMAG news

No passado dia 2, o Parlamento aprovou, na generalidade, o projecto de lei do PS para abolição das portagens em lanços das antigas SCUT (auto-estradas sem custos para os utilizadores) do Interior, sem alternativas de qualidade, com os votos a favor do PS, Chega, BE, PCP, Livre e PAN, votos contra do PSD e CDS e a abstenção do IL. Os projectos de lei do BE e do PCP que previam a abolição em mais lanços das SCUT foram chumbados, bem como os três projectos de resolução do PSD e CDS, IL e PAN.

Falta ainda debater eventuais alterações, em Comissão Parlamentar, após audições e debates na especialidade, após o que subirá de novo ao Plenário, para votação final. Claro que só entrará em vigor a 1 de Janeiro, depois da aprovação, em Dezembro,  do Orçamento de Estado para 2025.

O governo e os comentadores afectos aos partidos da AD não param de vociferar contra a “coligação negativa” do PS e do Chega. No entanto, o PS, na verdade, apresentou no seu programa eleitoral a abolição das portagens nas ex-SCUT, tal como os partidos da esquerda. Já o projecto de resolução do PSD/CDS apenas previa o fim faseado das Vportagens (como também defendia o Chega), sem quaisquer datas, não vinculativo, de resto, uma vez que não passa de uma mera recomendação ao governo, demonstrando, assim, não só incompetência governativa e parlamentar, como a continuação do desprezo pelas gentes do interior do país, como a região de Viseu que se viu cercada por pórticos, como se fosse uma reserva de índios, limitados no seu direito à livre circulação, dado que as ex-SCUT que nos servem, como a A24 e A25, não têm alternativas seguras e com um mínimo de qualidade e funcionalidade (Ir de Mangualde a Aveiro pela EN 16 demora 6 horas para percorrer 120 km). E se é certo que o PS, quando foi governo, teve oportunidade de abolir as portagens, não é menos verdade que também o PSD teve essa oportunidade. Aliás, na realidade, ambos os partidos chumbaram várias propostas nesse sentido, consoante estavam no governo ou na oposição. Por exemplo, na Assembleia Municipal de Viseu, em 28.06.2010, uma moção do Bloco de Esquerda (BE) a exigir a abolição das portagens só teve a favor o voto do próprio BE, tendo sido chumbada com os votos contra do PSD e do CDS e 10 abstenções do PS. Nessa altura, Almeida Henriques apresentou uma moção (com a posição de F. Ruas e do PSD nacional) exigindo que a instalação de portagens fosse feita em todas as SCUT sem excepção (como se uma injustiça aplicada universalmente fosse mais tolerável) admitindo uma discriminação positiva para as populações dos locais onde os traçados fossem sobrepostos aos dos IP, como a A25 e A24.

O Governo de Sócrates, depois da trapalhada das isenções em 46 concelhos, cedeu ao PSD cobrando portagens em todas as SCUT, limitando-se a isentar as populações e empresas locais nas primeiras 10 passagens e descontos de 15% a partir daí, até 1.05.2012, e só nos concelhos que ficassem a menos de 20 km das auto-estradas. Em 11.07.2010, no Parlamento, um projecto Lei do BE pela revogação das portagens nas ex-SCUT foi chumbado com os votos contra do PS e a abstenção do PSD e do CDS. E em 14.10.2010, também na Assembleia da República, os projectos-lei do PCP e do BE para revogar as portagens foram chumbadas com os votos do PSD, CDS e PS.

Os pórticos na A23, A24 e A25 foram ativados em 8 de Dezembro de 2011, por decisão do governo de Durão Barroso (PSD), embora só implementado com o governo de José Sócrates (PS). Foi o Decreto-Lei 67-A/2010,d e 14.06.2010 que viabilizou a introdução de portagens nas SCUT. O argumento invocado foi o falso princípio do “utilizador-pagador”, uma transposição abusiva do princípio do “poluidor-pagador”, usado para punir crimes ambientais. As SCUT (auto-estradas sem custo para os utilizadores) foram uma forma de compensar as regiões do interior discriminadas pela proliferação de auto-estradas, quase todas no litoral (algumas em duplicado), que deixaram Portugal como o país com as melhores estradas da Europa, ocupando a 2ª posição na qualidade rodoviária, enquanto não se investia o suficiente na ferrovia, o transporte do futuro, menos poluente e mais cómodo, continuando Viseu sem sequer uma ligação rodoviária da Estação de Camionagem à estação da CP de Mangualde (15 minutos pela A25), através de um autocarro, como já houve, nos horários dos comboios intercidades, como propus há mais de uma década na Assembleia Municipal. As SCUT foram uma forma de discriminação positiva das regiões servidas por IP (Itinerários Principais), como a de Viseu, onde cruzam o IP3 e o IP5 (financiados pelos fundos europeus de pré-adesão à CEE, mas que, por falta de visão estratégica, incompetência no planeamento, ou ainda qualquer “mistério” insondável, nos deram, durante décadas, “estradas assassinas”, conhecidas por “vias rápidas” para a morte. A generalidade das ex-SCUT, como a A23, A24 e A25, foram construídas em cima daqueles itinerários rodoviários complementares ou principais (IP) anulando essas vias alternativas, e deixando Viseu e outras regiões sem alternativas viárias com um mínimo de condições, com estradas onde, em certos locais, nem sequer conseguem cruzar dois camiões. “A introdução das portagens nas SCUT não constituíram apenas um elevado custo para os utilizadores, mas também para o Estado, e foram um atentado à economia das regiões do interior. As estradas são um bem público colectivo que assegura o direito à mobilidade de pessoas e bens e não devem ser privatizadas, como tem acontecido com as PPP rodoviárias. Muitas empresas agrícolas, industriais e comerciais da nossa região já se queixaram do impacto negativo das portagens. A Confederação das Micro, Pequenas e Médias Empresas denunciou que ao encarecer o custo dos transportes as portagens encarecem o preço dos produtos que vêm de fora e limitam o poder competitivo dos produtos regionais, para além de prejudicar o turismo, outra fonte de receitas, considerando que os descontos e discriminações positivas para residentes foram meras panaceias temporárias.

Por isso, quando o governo e os partidos mais ou menos liberais da direita se queixam de uma redução na receita do Estado de 158 milhões de euros, com esta abolição de portagens, esquecem-se de contabilizar o custo das portagens para as empresas da região e para milhares de trabalhadores no seu trajecto casa-trabalho, como é o caso de boa parte da população de Viseu que trabalha em empresas ou outros serviços públicos de concelhos vizinhos, como a PSA em Mangualde, a Martifer em Oliveira de Frades, o Hospital de Tondela, e muitas outras em Nelas, Vouzela, etc, sem esquecer os professores que diariamente se deslocam para escolas a dezenas e centenas de quilómetros de suas casas.

Vamos ver o que sai da discussão na especialidade e na votação final.   

O conteúdo Viseu livre do cerco das portagens, finalmente! aparece primeiro em Interior do Avesso.